6 de outubro de 2010

A Catedral

Debruçou, bebeu seu último gole de tequila e caiu com a testa no balcão. Ficou imóvel por alguns minutos até ser jogado pelos porteiros para fora do bar.

Quando acordou sua boca estava cortada, sua cabeça doía muito e teve a sensação de que seu corpo estava congelado. Levantou-se com dificuldade, seus pés doíam muito por causa do frio, e começou a andar pela praça deserta parando somente para vomitar. Dizem que melhora. Teria que encontrar algum lugar para dormir, pois logo a neve voltaria e com ela mais e mais frio.

Entrou pelo Parque Central e viu vários mendigos tremendo e gemendo pelos cantos. Aproximou-se de um deles para oferecer-lhe um cigarro, mas aquele homem pálido como a neve o expulsou dali dizendo que o banco era seu e que ninguém o tomaria.

Christopher tinha um apartamento nem modesto e nem luxuoso, e naquela noite saiu para beber só, pois havia perdido todos os seus amigos, talvez por sua arrogância de querer ser perfeitamente normal.

Durante anos, tudo o que havia feito era acordar, trabalhar, trabalhar e dormir. Não fazia sexo há muito tempo e não sabia mais o que era amor. Digamos que Christopher havia se tornado um “homo-sapiens” normalmente internauta.

Ao passar pela Catedral de Santa Eduvirges notou que as portas estavam abertas e todas as luzes acesas. Intrigou-se com aquilo e ficou parado em frente à porta central na dúvida de entrar ou não. Percebeu então que o padre falava algo que ele não compreendia. Resolveu chegar mais perto e ouviu perfeitamente:

- “Carpe Diem”. Dizia o padre, que jogava água benta sobre um caixão no centro do altar.

Havia estudado latim durante dois anos na universidade, e aquilo significava: “Aproveite o Dia”.

Quando chegou perto do caixão e preparou-se para olhar o falecido, pessoas ao redor levantaram-se e numa só voz disseram repetidamente:

- O futuro você não conhece e o passado se foi.

Quando olhou para o caixão não conseguiu raciocinar perfeitamente, pois estava deitado lá dentro e ao mesmo tempo olhava-se, em pé ao seu lado. Gritou desesperadamente para todos que somente repetiam:

- “Carpe Diem”.

Christopher correu para a porta central, a fim de sair daquele terrível pesadelo, mas a porta fechou-se rapidamente, fazendo um enorme barulho que estremeceu toda a catedral. Batia e, inutilmente, tentava abri-la. Virou-se então para trás e todos haviam sumido, menos seu cadáver.

Caminhou até o centro e ao olhar novamente para seu corpo morto, começou a chorar lamentando-se por todos os seus erros; por todas as noites de luar que havia perdido enquanto assistia televisão; pelas crianças carentes que não havia ajudado; pelos filhos que não teve; pelo amor que não sentiu e pela doçura infantil que sufocou, na ganância monetária dos seus negócios.

Christopher sentiu seu fim quando sua visão apagou, sua respiração cessou e sua mente deixou de existir.



FIM



Flávio Cuervo



* Conto classificado em 6º lugar no Concurso Internacional de Outono.

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