10 de março de 2011

Guerreiros do Tempo - Parte 2

Parte 2

Abri os olhos e vi que estava vivo e dentro de uma caverna. Até aí tudo bem. Afinal, uma caverna é melhor do que dois sóis torrando seus miolos. Mas ao tentar me mexer, notei que estava grudado no chão, como se alguém tivesse me colado no solo com uma cola potente.
Olhei para o lado esquerdo e vi Kietricci me olhando e tentando dizer algo, mas sua boca estava vedada com aquela substância. Virei o rosto para o outro lado e vi Muriáh também na mesma situação.
Tinha que fazer algo para nos libertar. Olhei à frente e vi dois ciclopes sentados numa pedra, guardando a entrada da caverna. Notei então um forte cheiro de carniça, olhei nas paredes e vi dezenas de cadáveres na mesma situação dos corpos encontrados por nós no forte. Ou seja, pendurados de cabeça para baixo, com as vísceras expostas, sem olhos e nem cérebros.
Livrar-nos daquela situação era fácil. Com meu sensor telecinético poderia libertar a todos daquele grude que nos mantia presos.
Tossi de propósito, para chamar a atenção e imediatamente as duas sentinelas se aproximaram de mim. Olhei-os e os levitei. Comecei a jogá-los um contra o outro no ar e quando notei que estavam mortos os coloquei levemente no chão, para não chamar a atenção dos outros. Eu estava na casa do inimigo e todo o cuidado era pouco.
Avistei um dos cadáveres na parede e vi que tinha um punhal preso à sua bota de couro, a trouxe até mim e depois a direcionei até Kietricci. Com muita dificuldade, já que operar movimentos sutis é muito cansativo com o sensor, fui cortando aquele látex ao redor da sua mão e do seu braço. Pedi a ela que cortasse o resto do material e se libertasse, para depois livrar-nos daquela situação. Minutos depois estávamos todos livres, fracos, mas livres.
Antes de qualquer viagem o Dr. Cazn nos aplicava várias doses de nutrientes. Essas doses se mantinham inteligentemente no organismo vitaminas, que se dissolviam durante cinco dias. Já estávamos no último dia. Precisávamos de alimento e líquido para suprir nossas necessidades. As doses de vitaminas do Dr. Cazn supriam 35% das necessidades diários de uma estrutura orgânica.
O que faríamos agora? Para onde iríamos? O Dr. Cazn até agora não fizera contato pelo meu sensor frontal. Kietricci me disse que seu sensor de pulso informava muita água à direita no interior da caverna. Muriáh começou a rastrear todo o terreno com seu radar wastuano.
O planeta Wastus me lembrava de Serin, a bela princesa que salvei do temível dragão vermelho da ilha de Chukkriz. Seu beijo fora inesquecível, mas quando o rei me obrigou a casar-me com ela, dei um jeito de pegar a recompensa, algumas tecnologias daquele reino e dar o fora. Dentre as tecnologias estava este radar, o mais avançado daquele universo.
Seguíamos cada vez mais pelo interior da caverna, que mais parecia um labirinto. Não havia sinal dos ciclopes, mas o radar anunciava sinais de vidas, só que rapidamente sumiam sem deixar rastros. Kietricci me disse então que estávamos caminhando sob a água. Ou seja, havia um grande lençol d’água sob nós. Bati com o pé no chão e percebi que o solo era oco. Levantei os braços e colidi com certa força as pulseiras no chão. O resultado foi um grande rombo na rocha. Olhei para baixo e vi um lago cheio de tochas na borda. No lado esquerdo uma construção de pedra erguia-se imponente.
Comecei a descer lentamente Muriáh até chegar à superfície da água. Ele encheu os cantis um a um e depois fez um sinal afirmativo. Iniciei a sua subida e no meio do caminho uma grande serpente surgiu do lago quase abocanhando meu amigo. Fiz tanta força para trazê-lo de volta que quase o esmaguei contra o teto. Perguntei a ele se havia se machucado e ele disse meio zonzo que não.
Saímos correndo em direção a saída da caverna, orientados pelo radar. Olhei para trás e vi que a gigantesca serpente saía do buraco.
Se eu estivesse com meu canhão explodiria a sua cabeça num piscar de olhos, mas infelizmente não podia contar com isso. Eles haviam pegado minha arma. Também não poderia usar o sensor de telecinésia frontal, pois a criatura era muito pesada.
Continuávamos a correr o mais rápido que podíamos. Até que Miriáh descreveu que devíamos ter virado à direita. Que droga! Estávamos perdidos.
Deparamos-nos com um paredão. Ou melhor, num beco sem saída. Bati então as pulseiras no paredão e foram pedriscos para todos os lados. Pois a rocha era muito espessa e rígida.
A serpente parou diante de nós e deu um grunhido tão estridente que tremeu todo o lugar. Depois tentou abocanhar Kietricci que surpreendentemente pulou no seu pescoço e conseguiu furar um dos olhos. O monstro tentava livrar-se dela, batendo com a cabeça na parede. Mas Kietricci manteve-se firme e bravamente furou o outro olho da serpente. Retirei o par de pulseiras e lancei para ela, que explodiu o crânio do monstro.
Respiramos aliviados e nos abraçamos longamente até sermos avisados pelo alarme do radar de que intrusos surgiam de todos os lados.
Ficamos muito preocupados ao percebermos que milhares de ciclopes começavam a surgir do chão. Estávamos encurralados.
De repente um deles usando um longo manto azul se aproximou. Parou em frente a mim e quando me preparava para me defender. Ouvi a criatura dizer “Não”. “Vocês mataram o monstro que açoitava meu povo durante gerações. Sou Cicloplarofiz, o imperador do povo ciclópades. Nossas sinceras desculpas pelos inconvenientes ocorridos. Um banquete será feito aos nossos convidados em meu palácio”.
Perguntei-lhe então, o porquê dos corpos mutilados por todos os lados. Ele me respondeu que eram rituais para acalmar a grande serpente. Era preferível dar de alimentos os forasteiros, do que alguém da sua sociedade. O monstro devorava apenas os cérebros e os olhos das vítimas. Que coisa nojenta!
Passamos a noite toda bebendo, comendo as especiarias e dançando em volta do fogo sagrado. Quem diria que aquele povo era tão divertido, havíamos dado a eles novamente a liberdade, não havia porque continuarem a ser hostis com o resto do universo. E em particular todos os méritos dava-se a Kietricci, a heroína de toda a batalha contra a serpente.
Olhei para Muriáh dançando com uma jovem ciclópade e para Kietricci com um sorriso maravilhoso em seu rosto. Acho que aquela bebida estranha que tomamos lá fora no deserto me fez ver uma linda mulher, e que além de bela também era audaz. Kietricci era a mulher perfeita.
Toquei o ombro dela e lhe dei um beijo. Ela me olhou com um olhar de espanto, sorriu e me disse: “Sempre esperei por esse momento. Achei que você não se importava para o amor. Você nunca teve tempo para momentos românticos. Sempre deixou seu lado rude falar mais alto. Mas agora posse beijá-lo”.
Como fui burro e egoísta durante tanto tempo. Agora queria que aquele momento durasse para sempre.
Depois da festa fomos para os aposentos reais. Era tudo meio arenoso, mas bem organizado. Coloquei Kietricci na cama e nos amamos até adormecermos. Dormimos muito até sermos acordados por um serviçal que anunciou o almoço.
Saímos do quarto e vimos Muriáh acompanhado de duas jovens ciclópades. “Você não perde tempo hein? Caro amigo. Duas?”. Ele respondeu: “Foram elas que me agarraram. Não fiz esforço algum. Tem coisa melhor?”. Bem o gosto era todo dele.

Logo após o almoço senti o meu sensor frontal vibrar intensamente. Será que era o Dr. Cazn? Sim, era ele.
Um portal abriu-se bem no meio dos dançarinos e o doutor com a sua ajudante andróide Zelina saíram de lá.
Corremos para abraçá-lo e fiz cara de bravo. “Só agora o Doutor aparece? Depois de tudo resolvido? Você não tem idéia do que passamos nesse planeta!”. O professor, como também era chamado, se defendeu dizendo que um defeito no sintonizador universal do tele-transporte havia causado tudo aquilo.
Fizemos as cerimônias de despedidos para o povo ciclope e fomos condecorados como Guerreiros do Tempo, uma homenagem que poucos recebem em todo universo.
Bem, esta foi mais uma das inúmeras viagens de aventuras que fizemos ao longo das nossas odisséias errantes. Quem sabe um dia eu tenha tempo para lhes contar mais uma narração espetacular. Finalizo por aqui, pois o sensor frontal está em alerta. E não se esqueçam: “O universo é finito para quem o desvenda”.

Até mais

Cirhannu


Flávio Cuervo

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