13 de junho de 2011

123º ANIVERSÁRIO DE FERNANDO PESSOA - HOMENAGEM.



Poema em Linha Reta

Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.





Pessoa

Sinto tudo se fechar ao meu redor.
Não concluo nada.
Não vejo caminho que me leve adiante.
Não consigo mais viver.
Viver.

Lágrimas no rosto.
Destino imbecil.
Que destrói todas as minhas paixões.
Por quê?
Por quê?

Como me sinto Fernando Pessoa!
Como me sinto Fernando!
Transbordado em tristeza.
Raivoso com o meio.
Incrédulo com a humanidade.
Imbecil humanidade.
Ignorante humanidade.
Humano.

A minha vida incrédula.
O Poema em Linha Reta.
Da minha existência torta.
Dentro da rotina reta.
Da função pública.
Como Fernando.

É terrível ser poeta.
É destrutível ser poeta.
É agonizante a poesia.
É morte em vida.
“Já sinto que não faço parte
Disso tudo nesse mundo”.

Vazio retrógrado.
Estilhaços de uma vida fútil.
Futilidade.
Frívolo.
Frívolo.
Frívolo.


“Estou farto de semi-deuses”
Estou farto daquilo que me alimenta.
Daquilo que me incha.
Da serventia mecânica.
Do ser lacrimoso.
Da lágrima.

Sou sentido receptivo.
Sou dor do inverno.
Choro púrpuro.
Poeta.
Pessoa.


Flávio Cuervo




FRASES DO AUTOR

As vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.

Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?

Quero para mim o espírito desta frase,
transformada a forma para a casar com o que eu sou:
Viver não é necessário; o que é necessário é criar.

Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.

A arte é a auto-expressão lutando para ser absoluta.

O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.

Querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer.

Leia a biografia do autor em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa

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